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19
mar-2014

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Aqui no Maranhão recebemos a visita de nossa amiga e pesquisadora da brincadeira de Bumba meu Boi, a Prof. Dra. Soraia Chung Saura, que nos presenteou com lindos relatos desse encontro.

“Admira primeiro, depois compreenderás.” Gaston Bachelard

A família aventura-se agora no Maranhão, chegando antes do início dos festejos juninos. Dessa vez estabelecem-se na cidade ? a ilha do amor, São Luís do Maranhão. Depois de meses e meses residindo nas casinhas das comunidades rurais, há uma animação geral com a casa nova: trata-se de um apartamento. Perfeito para acompanhar a maratona dos festejos juninos. Maratona porque equivale em empenho e esforços necessários para estar onde todos estão: nas festas. E que festas! Costumo pensar que não entendemos muito de festa, nós do sudeste. Elas por cá no Norte têm proporções ilimitadas, imensuráveis, com um contingente gigantesco de pessoas.

São João é o principal homenageado na semana que precede e sucede o seu dia, 24 de junho. E para ele, são mais de 50 arraiais espalhados pela capital. Cada qual com inúmeras apresentações. Os grupos de Bumba-meu-boi vêm de todo canto. Do interior para a cidade. Manifestam-se em todo seu esplendor. A brincadeira encontra seu ponto mais alto

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Pois que prepararam, cada qual seu boi, cada qual em seu canto, em segredo, essa homenagem. Bordam e ensaiam, desde a quaresma, maravilhas primorosas, novas toadas, capricho e encanto, a fim de agradar os santos. Os desenhos são significativos e maravilhosos, trabalhos de devoção, miniaturas do mundo, intimidade das coisas. Apreendem a grandeza da vida em pequenos e detalhados desenhos, imagens longínquas, horas a fio a prender miçangas coloridas e brilhantes no veludo preto em uma composição que nunca tem fim. Observamos as bordadeiras dando os últimos arremates, ainda antes das apresentações. “Bordado sempre falta, nunca acaba” ouvi de uma delas. Anunciam assim o continuum do mundo.

No São João, cada grupo batiza o seu boi, um compromisso. O bicho deixa sua condição de animal pagão para solidificar-se em sua natureza santa, passa a ser representante dos homens perante os santos e entidades, podendo brincar à vontade. Cantam-se toadas belíssimas:

“Ó meu São João / Venha receber / Essa coisa linda / Que fizemos para você. / Com a sua luz divina / Ilumina o meu Batalhão / É humilde essa oferenda / Mas é de bom coração.”
O nome do novo novilho brilha grafado no veludo preto: “Mimo de São João”, “Brilho da Noite”, “Deus é Quem Sabe”, “Pra Despachar”, “Lindo Querido”, “Noite Linda?, “Ajuda de Deus”, “Belo Dia”, “Brilho da Fazenda”, “Jóia da Madrugada”, “Poder de São João”, “Encantado”, mostram a que veio ao mundo.

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David tem um jeito estranho de se mimetizar entre as pessoas, em fazer de sua mão firme de câmera um gesto invisível, concentrado no movimento colorido da noite. Renata tem um olho na cena, outro nas crianças e os ouvidos para os brincantes. É um casal todo ouvidos, silêncio e respeito. Seus filhos embaralham-se nas brincadeiras, são só sorrisos entre as fitas, as penas e os brilhos. Aprendem a tocar, a cantar e a dançar com outras crianças. Se podemos dizer que as Festas possuem uma função no mundo, a principal deve ser a de realizarmos todos, coletivamente, esse exercício mítico de nos aventurarmos em universos ancestrais, questões desafiadoras para a humanidade latente em todos nós: o bicho, a fera, o perigo, a vida, a morte, a angústia diante do tempo que se esvai, implacável. A festa e a beleza de estarmos vivos em um mundo mágico, ano após ano. Há sedução, maravilhamento, arrebatamento. Diante de um folguedo colorido e festivo, não há quem não se poste encantado – os que assistem e os que fazem, vale lembrar que participantes somos todos. Assim, estar criança no meio de uma festa colorida e barulhenta, repleta de máscaras, sons e cores, tendo um bicho Boi colorido, brilhante, dançante e com chifres reais (portanto, ameaçadores) é aventura de viver em um mundo mitológico e de encantarias.

Texto: Soraia Chung Saura 

Fotos: Renata Meirelles

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