ago-2014
O tradicional casamento pomerano segundo as crianças
Visitamos a casa do Sr. Levi Roger em um domingo ensolarado em que recebia amigos e parentes, como fazem todos os domingos.
Reunir um grupo de crianças das mais diferentes faixas etárias sem compromissos definidos e com espaço para fazerem o que quiserem é o suficiente para que o imaginário infantil mostre sua força e vigor.
Não precisou muito tempo para que essas crianças organizassem uma feira com tudo o que acharam pela horta e pomar: repolho, bananas, limões, abóbora, cebola, chuchu; tinha de tudo.
Cada qual ia dando sua contribuição de quem seria quem nessa história e como organizariam cada elemento e assim, puxa daqui e dali, em pouco tempo a feira tomou corpo.
Os meninos encarregaram-se da organização das barracas e do comércio dos alimentos e as meninas compraram os produtos, pagando com folhas de laranjeira. Em seguida, elas carregavam como podiam todas essas compras até a casinha de bonecas – um espaço do galinheiro que foi ocupado e detalhadamente organizado pela anfitriã Eliandra, de 7 anos.
Mal dispuseram os alimentos e as facas sobre a mesa, começaram a picar tudo como se soubessem o que era para ser feito. Já estava nas mãos dessas meninas a prática de manusear as facas e organizar os pratos em elaboradas formas estéticas. Suas mãos trabalhavam sem pensar ou discutir entre elas o destino daquela comida: faziam tudo comandadas talvez pela memória afetiva de um saber que não perdeu o seu espaço entre as crianças pomeranas.
Foi a partir desses pratos, tão ricamente organizados, que surgiu a ideia de celebrar um casamento. Olhando para aquelas cebolas, pedras, limões, terra, folhas, bananas, etc. parecia que o casamento se fazia necessário, como se não tivessem dúvida de que seria uma sequência lógica daquela brincadeira. Não que já tivessem brincado dessa forma, mas os pratos davam essa dica, imprimiam esse desejo natural. Assim, a brincadeira de casamento surgiu a partir da comida.
O livre trânsito em todos os espaços do casamento adulto cria, no corpo dessas crianças, um saber vivencial que fica nítido na sua brincadeira.
Cada ato tinha seu propósito certo, nada era aleatório ou sem sentido e, em poucos minutos, a barraca da feira se transformou em um altar decorado e ficou definido quem seriam os noivos, o pastor e os copeiros. Enfeitaram a noiva, fizeram as bandeiras dos copeiros usando sacolas plásticas amarradas em cabos de vassoura e transportaram os convidados no caminhãozinho de madeira construído por Joemilson, de 12 anos.
A pastora celebrou a cerimônia, assistida também por adultos curiosos pelo desenrolar dessa brincadeira.
Decretado o matrimônio, a sequência do ritual se seguiu com todas as etapas dos tradicionais casamentos pomeranos e a festa começou.
Havia ali tamanha verdade que um dos adultos se sentiu impulsionado a contribuir na brincadeira e passou a tocar sanfona, para a alegria de todas as crianças.
Teve da “dança dos noivos” aos gritos dos copeiros, o “reshtemish” (outra dança típica), a noiva jogando o buquê, o “quebra-louça” com pratos descartáveis e, é claro, o jantar com os pratos que deram origem à brincadeira.
O espaço do galpão foi transformado em salão de festa dominado pela brincadeira. Os adultos, do lado de fora assistindo tudo pelas janelas, jogavam seus sorrisos tímidos de aprovação, reafirmando a proximidade do espaço social do adulto e da criança nessa comunidade.
Texto e fotos: Renata Meirelles
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