mar-2014
Carrinho de Boi
A zoada se ouve de longe, se ouve há tempos distantes. Carro bom tem que zoar, tem que se fazer ouvir.
Há várias gerações a região de Cururupu é marcada pela força desses carros feitos de madeira e ferro, puxados pela tração de dois bois.
Cheda, canga, paré, rodeiro, canzil, taca, cébria e mais um bocado de termos das partes desses carros, é cultura dessa gente que entende bem o quão suave pode ser uma roda de borracha comparada com a de madeira.
Os carrinhos de boi construídos pelos meninos da comunidade quilombola de Entre Rios não deixam de fora algumas partes como a canga, o canzil e principalmente o som da zoada. E aí vale usar querosene nos rodeiros e lotar o carro de pedras, afinal, carro leve não zoa.
Nascidos das raízes de cortiça, os bois dos meninos chegam a sangrar seiva quando recém feitos.
Mateus e Netinho levam a cortiça para o quintal, debaixo de um ingazeiro, e trabalham arduamente com seus facões, em uma mesa sustentada por um tronco antigo e firme.
“Brinquedo comprado quebra logo e a gente não consegue consertar” conclui Mateus aos seus 10 anos de idade. Quebrar todos quebram, mas os que são feitos por eles tem essa vantagem de ser consertados, e aí mora um trabalho quase necessário para esses meninos. Consertar leva tempo, dedicação, empenho, resolução de problemas… eita coisa boa para os moleques.
Só a roda do Mateus quebrou umas duas ou três vezes enquanto fazia. Quase nas últimas batidas de facão, crás… rachava ao meio. Recomeçar, refazer, repetir os mesmos gestos com outro cuidado, aprimorar os movimentos, isso é parte do brincar.
Ao final do dia os bois merecem voltar ao curral, soltar-se dos carros para descansar depois de tanta brincadeira.
Texto e fotos: Renata Meirelles
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