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13
mar-2018

‘Escutar crianças vai muito além de ouvir suas falas verbais’

Clique na imagem para acessar o material

Essa é uma das máximas defendidas por Adriana Friedmann, especialista e consultora nas temáticas da infância e do brincar e referência nos estudos sobre escuta e observação de crianças.

Há mais de 30 anos, Adriana dedica-se a um profundo estudo das linguagens infantis e nos lembra de que, para ‘escutar’ uma criança, precisamos nos atentar àquilo que está além do verbal: “Corpos, gestos, brincadeiras, expressões plásticas e musicais, comportamentos, movimentos, doenças: tudo isso constitui as linguagens essenciais da criança”, afirma a pedagoga. Mas, para nos abrirmos a este tipo de escuta, em que o corpo revela tanto ou mais do que a palavra, é preciso reeducar o olhar e encontrar novos canais de compreensão sobre a infância.

Seu novo livro Escuta e Observação de Crianças: processos inspiradores para educadores‘ é um convite a mergulhar neste novo olhar e nas diversas possibilidades de escuta e observação de crianças. A publicação apresenta as pesquisas desenvolvidas por 14 pesquisadoras que, sob a orientação de Adriana, desenvolveram trabalhos em diferentes espaços, com crianças de diferentes realidades e contextos.

Conversamos com Adriana Friedmann, que nos contou sobre o novo material, lançado neste mês em São Paulo, e comentou sobre o cenário da escuta de crianças no Brasil. Para ela, estamos no caminho, mas ainda há uma longa trajetória a ser percorrida. Confira!

 

Território do Brincar – Há anos, você dedica-se a escutar e observar as crianças. O que notou de transformação ao longo deste tempo? No que avançamos?

Adriana Friedmann – Os estudos sobre escuta e observação de crianças surgiram a partir das contribuições das ciências sociais. No exterior, este processo teve início nos anos 80, aqui no Brasil, no início de 2000. Assim, as pesquisas e práticas sobre este tema são bastante recentes. Temos, hoje, um número crescente de profissionais desenvolvendo ensaios nesta área. Digo ensaios, pois há várias formas e vertentes de olhar crianças e compreender suas realidades; ainda estamos num processo de entendimento e apropriação destes diversos caminhos para olhar a infância.

Sobre os avanços, posso apontar que este tema vem se tornando pauta àqueles que atuam com crianças e que a consciência sobre a importância destas escutas tem crescido consideravelmente. Estamos avançando na sensibilização dos educadores e, bem lentamente, na efetiva concretização dos processos de escuta de crianças. Mas, é premente ainda a compreensão da imensa diversidade de temas que surgem a partir destas pesquisas e o desafio de conhecer os inúmeros grupos infantis e suas realidades ainda é grande.

TDB – No seu novo livro, ‘Escuta e Observação de Crianças: processos inspiradores para educadores’, o trabalho foi concebido com um grupo de pesquisadoras. Pode nos contar sobre esse processo de construção coletiva?

AF – A publicação é resultado de um processo de orientação e formação de 14 pesquisadoras, que participaram do curso “Pesquisas com Crianças”, que ministrei em 2016, no Centro de Pesquisa e Formação do SESC. Nesta ocasião, nos debruçamos sobre os conceitos básicos acerca da infância e sobre as variadas áreas de conhecimento que relacionam-se ao universo infantil; também fizemos um mergulho nas várias possibilidades de escutar e observar crianças. Na sequência, cada participante do curso escolheu um grupo de crianças para estudar e as orientei no processo de pesquisa. As participantes iam a campo e, a cada 15 dias, nos reuníamos para debater suas vivências, angústias, observações e percepções. A construção coletiva foi muito rica e imprescindível para a compreensão sobre o que significa ser um pesquisador da infância: ético, aberto e comprometido. Ao final das idas a campo, já com as produções em mãos, fizemos leituras coletivas profundas – apoiadas por pensadores das áreas de filosofia, literatura, psicologia, artes, antropologia, entre outras. E, finalmente, cada pesquisadora escolheu um recorte dentro de seu processo para compartilhar nesta publicação.

TDB – Quais as particularidades de realizar pesquisa com crianças?

AF – As escutas e observações de crianças exigem respeito e ética na abordagem junto às mesmas: não se trata unicamente de registrar suas falas, produções e ações. Muito menos de entrevista-las com perguntas e indagações. Trata-se muito mais do pesquisador se predispor a estar inteiro, presente e conectado com as crianças e seus mundos externos e internos, de apreender as narrativas infantis e compreender as raízes multiculturais e os contextos das crianças observadas. Trata-se de olhar cada criança em sua inteireza e estar aberto  para acolher o que elas expressam naturalmente. Precisamos aprender com elas.

TDB – Qual o grande desafio do pesquisador da infância?

AF – O desafio para os adultos passa por uma reconexão com sua própria sensibilidade, no sentido de conhecer as crianças a partir do estabelecimento de vínculos nos momentos em que as observamos e escutamos. E, após realizadas estas conexões, que tornam a sensibilidade e a intuição prioritárias, é fundamental que o pesquisador acesse as diversas áreas do conhecimento que se debruçam sobre o estudo do ser humano, para aprofundar e respaldar o olhar.

TDB – Como uma escuta sensível pode contribuir para a prática dos educadores?

AF – Estas escutas sensíveis são essenciais para os educadores. Por um lado, permitem que eles ofereçam às crianças possibilidades de se expressarem e viverem suas infâncias de forma significativa, acessando tempos e espaços de autonomia e liberdade. Por outro lado, para realmente conhecerem as crianças com as quais convivem: suas preferências, necessidades, potências, seus repertórios e sua bagagem cultural e, a partir disso, repensar e readequar práticas, programas e atividades que potencializem os canais expressivos de cada criança e que introduzam novos desafios a partir dos seus interesses.

TDB – Qual a grande contribuição deste material?

AF – Penso que este material é uma importante contribuição para a comunidade que se dedica a estudar e compreender as crianças e suas infâncias. Ele oferece uma variedade de contextos e grupos pesquisados, além de relatar os processos individuais vivenciados pelas pesquisadoras. O livro foi concebido de forma dialógica: no decorrer dos artigos comento os processos das pesquisadoras, trazendo conceitos fundamentais à prática da pesquisa com crianças. O material tem o intuito de ampliar a consciência e a sensibilidade sobre a importância da escuta e observação de crianças e atenta à urgência de abrirmos brechas para estes processos de escuta nos cotidianos de trabalho de educadores e especialistas. O livro também aponta possibilidades de inspiração e mostra que a infância merece este olhar aprofundado e comprometido.

<CLIQUE AQUI PARA ACESSAR O MATERIAL NA ÍNTEGRA>

<PARA SABER MAIS> Diálogos do Brincar – “A voz da criança’, com Adriana Friedmann

 

Por Carolina Prestes | Território do Brincar

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  • muito legal! para ampliar essa tão importante reflexão, compartilhamos aqui texto do blog da ninguém cresce sozinho com este mesmo tema: http://ninguemcrescesozinho.com.br/2018/03/12/diferentes-formas-de-escutar-as-criancas/

  • Lindo trabalho. Parabéns. Nós que trabalhamos com crianças precisamos de obras como essa.

  • Vilma Ribeiro Gomes disse:

    Muito bacana, no nosso curso de pedagogia discutimos sobre culturas infantis e como pensar a infância sem ser apenas pelo olhar do adulto.A crianca esta sempre falando “sem dizer” e quando escutamos o não verbal e uma possibilidade de entender jnfancia sobre a ótica da propria criança.

  • Cléia Paixão disse:

    Feliz em conhecer pessoas que escutam verdadeiramente o ser humano. O escutar vai muito além dos sons e vozes proferidas, escutar tb é sentir com o corpo, alma e coração. Esse conjunto fortalece a empatia, o perceber o outro. Parabéns! Quero muito este livro!

  • Samila disse:

    Quero adquirir o livro

  • Cintia de Souza disse:

    Parabéns pela excelente matéria e também pelo livro.
    Gostaria muito de adquirir o livro.

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